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Dúvida sobre a verba 2.14 da lista I anexa ao CIVA



Dúvida sobre a verba 2.14 da lista I anexa ao CIVA
22-07-2020

Continuam a existir muitas dúvidas em relação à verba 2.14 da lista I anexa ao CIVA, pois esta foi alterada com efeitos a 1 de janeiro de 2019 e, segundo o entendimento de um inspetor da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), para beneficiar desta taxa reduzida é necessário discriminar os serviços na fatura, ou seja, só o que for transporte de passageiros é que vai à taxa reduzida e os restantes serviços são à taxa normal. Qual o entendimento da Ordem sobre esta matéria?

Parecer técnico

Refere-se que continuam a existir muitas dúvidas em relação à verba 2.14 da Lista I anexa ao CIVA, que foi alterada com efeitos a 1 de janeiro de 2019 e, segundo o entendimento de um inspetor da AT, para beneficiar desta taxa reduzida é necessário discriminar os serviços na fatura, ou seja, só o que for transporte de passageiros é que vai à taxa reduzida e os restantes serviços é a taxa normal, no entanto, existem outros colegas que dizem que a taxa reduzida é aplicada ao serviço como um todo.
Perante tais dúvidas, vem solicitar que lhe seja comunicado o entendimento da OCC sobre a matéria.
Após a alteração que lhe foi introduzida pela Lei n.º 71/2018, de 31 de dezembro, a verba 2.14 da lista I anexa ao CIVA passou a ter a seguinte redação:
«2.14 - Transporte de passageiros, incluindo aluguer de veículos com condutor. Compreende-se nesta verba o serviço de transporte e o suplemento de preço exigido pelas bagagens e reservas de lugar, bem como o transporte de pessoas no âmbito de atividades marítimo-turísticas. (Redação da Lei n.º 71/2018, de 31 de dezembro)
Compreende-se nesta verba o serviço de transporte e o suplemento de preço exigido pelas bagagens e reservas de lugar.»
De conformidade com o Ofício-Circulado n.º 30207, de 4 de janeiro de 2019, da Área de Gestão Tributária do IVA, divulgado na sequência da entrada em vigor da Lei n.º 71/2018, de 31 de dezembro, que aprovou o OE para 2019, o transporte de pessoas no âmbito de atividades marítimo-turísticas passou a beneficiar, a partir de 1 de janeiro de 2019, da taxa reduzida aplicável ao transporte de passageiros.
Até 2017, as informações vinculativas produzidas pela AT sobre a matéria em análise neste parecer técnico iam com razoável clareza no seguinte sentido:
•       Sempre que passeio turístico e refeições sejam autonomizados na fatura, as prestações mantêm a sua identidade, cabendo à primeira a taxa reduzida e às segundas a taxa intermédia;
•      Quando passeio turístico e refeições não sejam autonomizados na fatura, as prestações perdem a sua identidade, devendo por isso aplicar-se ao todo a taxa normal do imposto; 
•       A finalidade "turística” do transporte de passageiros é irrelevante ao seu tratamento.
Com as informações vinculativas n.º 12 637, de 2017, e n.º 13 464, de 2018, parece dar-se uma viragem na doutrina administrativa, sugerindo a AT agora a aplicação de taxa normal de IVA a todo o valor dos passeios turísticos sempre que estes compreendam elementos adicionais ao transporte de passageiros, tais como as refeições, e parecendo irrelevante agora à AT o modo como o sujeito passivo os discrimine em fatura.
Este entendimento levou o Grupo Parlamentar do PS, no âmbito da discussão na especialidade do OE para 2019, a propor a alteração da redação da referida verba 2.14, por considerar que a existência de refeições incluídas no preço, ou de outras atividades, não deve excluir a qualificação como transporte de passageiros das restantes componentes do preço, desde que discriminadas na fatura.
Por outro lado, segundo a referida proposta do Grupo Parlamentar do PS, mais recentemente, a Autoridade Tributária tem vido, em certos casos, a assumir o entendimento de que o serviço de transporte de passageiros, quando praticado no âmbito de atividades marítimo turísticas, deverá ser tributado com uma taxa de 23 por cento.
E daí que o Grupo Parlamentar do PS tenha proposto que o transporte de pessoas com finalidade de passeio turístico seja tributado como transporte de passageiros, independentemente da presença de outros elementos no serviço, desde que estes estejam discriminados e aplicando-se a este a sua taxa própria, tendo esta proposta sido acolhida na votação na especialidade e dado origem à alteração da verba 2.14.

Jurisprudência sobre a matéria

O CAAD já se pronunciou sobre a matéria em análise na decisão proferida em 3 de março de 2020, Processo n.º 132/2019-T, que tem como tema «IVA - Atividade marítimo turística; Verba 2.14 da lista I anexa ao CIVA; natureza inovadora ou interpretativa da nova redação; informações vinculativas.»
De acordo com os autos, a discussão entre as partes centra-se na posição da AT, de que a recorrente discorda, de que o serviço de transporte de pessoas no âmbito das atividades marítimo-turísticas não integra a noção de transporte de passageiros na aceção da verba 2.14 da lista I anexa ao CIVA, na redação em vigor em 2018.
É certo que, no âmbito dos barcos, os clientes da recorrente também são transportados, mas tal transporte é instrumental relativamente à atividade lúdico/turística, não sendo a deslocação a necessidade económica que a atividade do transportador visa prosseguir, ao passo que no contrato de transporte a deslocação do utente do serviço constitui o cerne do objeto negocial.
O serviço de passeio de barco é um todo, do qual o transporte é uma componente que naquele se dilui, carecendo de sentido fora do conjunto de que faz parte. Está imbrincado com as finalidades e serviços globais inerentes ao passeio. Não se subsume, pois, no conceito de transporte de pessoas sendo, aliás, manifestamente, uma realidade de tipo diferente, expressamente qualificada pela Lei como «atividades marítimo-turísticas» na modalidade de «passeios marítimo-turísticos.»

Prestações de serviços compostas

A decisão da matéria em apreciação impõe a análise do conceito de prestações de serviços compostas, sobre o qual o Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) já se pronunciou em de 17 de janeiro de 2013, no acórdão proferido no processo C-224/11, designado por BGZ Leasing sp. z o.o..
O citado acórdão, a propósito da distinção entre se uma prestação é única, composta ou se são duas prestações distintas, esclarece que, para efeitos de IVA, cada prestação deve ser considerada distinta e independente, tal como resulta do artigo 1.º n.º 2, segundo parágrafo, da diretiva IVA.
Refere, ainda, aquele acórdão que, «não obstante, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que, em determinadas circunstâncias, várias operações formalmente distintas, suscetíveis de ser realizadas separadamente e de dar assim lugar, em cada caso, à tributação ou à isenção, devem ser consideradas uma operação única quando não sejam independentes.»
Ou seja, há situações em que apesar de existirem várias prestações, estas se consideram indissociáveis, referindo a este respeito o TJUE, no citado processo, que «está em causa uma operação única, nomeadamente, quando dois ou vários elementos ou atos fornecidos pelo sujeito passivo ao cliente estão tão estreitamente ligados que formam, objetivamente, uma única prestação económica indissociável, cuja decomposição revestiria um caráter artificial.»
Assim, o Tribunal de Justiça já decidiu que não só cada prestação deve ser normalmente considerada distinta e independente, como também nas situações em que a operação seja constituída por uma prestação única no plano económico não deve ser artificialmente decomposta.
Resulta, ainda, da jurisprudência daquele Tribunal que, na hipótese de uma operação complexa única, uma prestação deve ser considerada acessória em relação a uma prestação principal quando não constitua para a clientela um fim em si, mas um meio de beneficiar, nas melhores condições, do serviço principal do prestador (acórdãos do TJUE, de 22 de outubro de 1998, Madgett e Baldwin, C 308/96 e C 94/97).
Assim, uma vez que, por um lado, cada prestação deve normalmente ser considerada distinta e independente e, por outro lado, a operação constituída por uma só prestação no plano económico não deve ser artificialmente dividida, para não se alterar o funcionamento do sistema do IVA, importa, em cada caso concreto, averiguar os elementos característicos da operação para se determinar se os serviços fornecidos constituem várias prestações principais distintas ou uma prestação única.
Em conformidade com este entendimento, torna-se essencial determinar se, no caso submetido à apreciação da OCC, os serviços fornecidos formam uma prestação única economicamente indivisível, que seria artificial separar, ou se são constituídos por diversas prestações de serviços individualizadas.
No caso submetido à apreciação da OCC, o serviço prestado aos passageiros parece ter uma natureza complexa (corresponder ao somatório de vários tipos de serviços: por exemplo, refeições, mergulho com cetáceos, disponibilização de equipamento de mergulho/pesca/observação, briefings pedagógicos/culturais, pescaria desportiva, etc.).
O transporte de pessoas no âmbito de atividades marítimo-turísticas parece justificar o fornecimento de refeições, quando esse transporte compreenda o horário normal das refeições.
Parece assim que o transporte de pessoas e o fornecimento de refeições a bordo no âmbito de atividades marítimo-turísticas constituem prestações de serviços indissociáveis, devendo ser consideradas como uma prestação única, abrangida pela verba 2.14 da lista I anexa ao CIVA, uma vez que o transporte é a prestação de serviço preponderante. 
Já quanto ao mergulho com cetáceos, disponibilização de equipamento de mergulho/pesca/observação, briefings pedagógicos/culturais, pescaria desportiva, parece estarem em causa prestações de serviços distintas e independentes.
E assim, mesmo sendo tais prestações de serviços faturadas juntamente com o transporte de pessoas no âmbito de atividades marítimo-turísticas, tais prestações de serviços constituem prestações de serviços distintas do referido transporte, devendo ser-lhes aplicável a taxa de IVA correspondente a cada prestação de serviços.
Em nosso entender, o transporte de pessoas e o fornecimento de refeições a bordo no âmbito de atividades marítimo-turísticas constituem prestações de serviços indissociáveis, devendo ser consideradas como uma prestação única, abrangida pela verba 2.14 da lista I anexa ao CIVA, uma vez que o transporte é a prestação de serviço preponderante. 
Já quanto ao mergulho com cetáceos, disponibilização de equipamento de mergulho/pesca/observação, briefings pedagógicos/culturais, pescaria desportiva, parece estarem em causa prestações de serviços distintas e independentes.
E assim, mesmo sendo tais prestações de serviços faturadas juntamente com o transporte de pessoas no âmbito de atividades marítimo-turísticas, tais prestações de serviços constituem prestações de serviços distintas do referido transporte, devendo ser-lhes aplicável a taxa de IVA correspondente a cada prestação de serviços.
É este o nosso entendimento sobre a questão colocada.
Para um cabal esclarecimento da matéria, sugerimos a apresentação de um pedido de informação vinculativa à AT.







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